sábado, 31 de março de 2012

A GUARDA MUNCIPAL E A CONSTITUIÇÃO DE 1988... - 20/03/2012

A GUARDA MUNCIPAL E A CONSTITUIÇÃO DE 1988... - 20/03/2012 Fonte : SINDELPOL RJ O artigo 144 da Constituição Federal de 1988 (CF/88) estabelece que "a segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio...". Mais adiante em seu parágrafo 8º especifica que "os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei". Em função da interpretação gramatical do texto, muitas vozes têm se levantado contra as guardas municipais. E assim o fazem por entender que a CF/88 relegou as guardas municipais a simples e mera atividade de vigilância patrimonial: não pode fiscalizar e controlar trânsito, não pode usar armas, não pode atuar na preservação da ordem pública nem tampouco realizar policiamento ostensivo. Alguns até, de forma tosca, afirmam que "a Guarda Municipal só pode fazer vigilância patrimonial", demonstram certa precipitação, porque não é este o teor do texto constitucional. PODER DE POLÍCIA Antes de falarmos sobre Guarda Municipal precisamos primeiro entender o significado de Poder de Polícia desprovido de quaisquer adjetivos (civil, militar, judiciária, sanitária, legislativa, etc). O artigo 78 do Código Tributário Nacional nos oferece um conceito exato, quando estabelece que "considera-se poder de polícia a atividade pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, a ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos". Quando o artigo 144 da CF/88 fala em "dever do Estado", o legislador quis dizer unidades federativas, isto é, União, Estados, Municípios e Distrito Federal. Dentro deste contexto de dever constitucional atribuído aos municípios, suas Guardas Municipais, lato sensu, equiparam-se aos demais órgãos constitucionais de segurança pública, porque estão inseridas no capítulo constitucional específico para a Segurança Pública, com ênfase para a PROTEÇÃO de seus BENS, SERVIÇOS e INSTALAÇÕES. Vejamos o significado e o alcance de cada um dos elementos da dicção desta norma constitucional. CONCEITO CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO PROTEÇÃO, segundo a doutrina mais recomendada, consiste no conjunto de providências contra dano ou prejuízo. Em outras palavras, proteger é dar segurança. A forma mais comum de proteção está na PREVENÇÃO. Prevenir é evitar a ocorrência do mau, ou, se antecipar a ele; ela pode se desdobrar em primária, secundária ou terciária. Do ponto de vista da Administração Pública, a prevenção primária consiste na prestação de serviços públicos sociais e ações comunitárias para gerar um ambiente social favorável. A prevenção secundária consiste no exercício do poder de polícia para restringir ou limitar as liberdades individuais em favor do bem coletivo e do interesse público. Sendo órgão do Município constitucionalmente dotado de poder de polícia, a Guarda Municipal deve contribuir no conjunto da prevenção primária. Quanto a prevenção secundária, a Guarda Municipal vai executa-la em dois momentos. Em primeiro lugar, através de ações de vigilância constante, circulando, exibindo sua presença de forma bastante ostensivamente, como forma de coibir, de inibir, de desencorajar eventual infrator. Em segundo lugar, desenvolvendo ações de controle e fiscalização sobre determinados SERVIÇOS PÚBLICOS contratados, concedidos, permitidos, cedidos, etc: segurança, higiene, ordem pública, costumes, diversões, lazer público, atividades econômicas dependentes de autorização do Poder Público, etc. O ALCANCE OBJETIVO E SUBJETIVO DA PROTEÇÃO Nos moldes acima mencionados, a proteção constitucional à cargo das Guardas Municipais deve recair sobre tudo aquilo que gravita em torno de BENS, INSTALAÇÕES E SERVIÇOS, do ponto de vista objetivo e subjetivo. Isto quer dizer que A PROTEÇÃO DEVE ALCANÇAR QUEM DÁ, QUEM MANTÉM E QUEM RECEBE OS SERVIÇOS, BENS E INSTALAÇÕES. A Guarda Municipal deve proteger não só os serviços propriamente ditos (prevenir e reprimir qualquer ato ou fato que possa prejudicar, danificar ou impedir), bem como, proteger a incolumidade do servidor público, que opera os bens, instalações e serviços, e a incolumidade do usuário desses serviços. Damos um exemplo simples: um grupo de baderneiros entra numa praça pública e passam a importunar as pessoas; logo depois, resolvem pegar uma jovem e estuprá-la. Vejamos então: de acordo com a "tese proibitiva", se houvesse um guarda municipal no local, ele não poderia fazer nada, porque simplesmente não houve qualquer prejuízo ao bem público; portanto, ele deveria simplesmente assistir ao grupo de baderneiros importunando as pessoas, e, passivamente assistir ao estupro de uma jovem, simplesmente porque, segundo "acham" que a Guarda Municipal "é somente para vigilância patrimonial". Considerando que as instituições policiais estaduais não têm condições nem capacidade de se fazerem presentes em todos os lugares, ao mesmo tempo, seria incrivelmente ridículo imaginar que esse Guarda Municipal tivesse que ligar para uma ou outra instituição para saber se poderia prender os baderneiros por contravenção de importunação ao pudor e estupro, porque tal atividade é exclusiva desta ou daquela instituição. BENS, INSTALAÇÕES E SERVIÇOS PÚBLICOS BENS PÚBLICOS são todas as coisas corpóreas ou incorpóreas, imóveis, móveis e semoventes, créditos, direitos e ações, que, de qualquer forma pertençam ao município. Neste universo se inserem as INSTALAÇÕES públicas, que constituem o patrimônio físico da municipalidade. Os bens podem ser de uso comum do povo (ruas, praças, rios, estradas, etc), bens dominiais (bens públicos disponíveis) e os bens de uso especial (bens públicos aplicados a serviço ou estabelecimento de instituições públicas). Portanto, para proteger as ruas e todos os seus usuários, a Guarda Municipal deve estar presente nas ruas, dia e noite, realizando rondas escolares e preventivas, controlar, fiscalizar e atuar amplamente no trânsito, até porque, de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro, o Trânsito do Município é da sua mais absoluta competência (art.21). Pode até conveniar para que algum órgão do Estado possa suprir momentaneamente a insuficiência do município para prestação destes serviços. Entretanto, estando devidamente capacitada e aparelhada, a Guarda Municipal, pode e deve assumir o trânsito no âmbito municipal. SERVIÇO PÚBLICO é todo aquele prestado pela Administração por seus delegados, sob normas e controles do Município, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade, ou simples conveniências do Município. Podemos exemplificar a extensão do que seja serviço público do município, citando alguns serviços prestados apenas pela Secretaria de Promoção Social: assistência ao menor, ao idoso, à criança, à portadores de necessidades especiais, à família; casa de passagem; núcleo de atendimento à família e programa de atendimento integral à família; núcleo integrado de atendimento à mulher, etc. Todos esses serviços devem ser objeto da mais ampla proteção da Guarda Municipal. Aliás, como dissemos acima, não só esses serviços, mas também, seus prestadores e beneficiários são abrangidos pela proteção constitucional deferida às Guardas Municipais. Isso significa que a Guarda Municipal pode e deve atuar para PREVENIR E REPRIMIR as infrações penais e seus autores, que venham atentar contra os prestadores e os beneficiários destes serviços. Nesse sentido a dicção do artigo 301 do Código de Processo Penal não deixa dúvidas: "qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito". Ora, se "qualquer um do povo pode", por que motivo a Guarda Municipal não pode efetuar prisões? Pode e deve efetuar prisões dos criminosos que cometam quaisquer crimes que atentam diretamente contra as várias formas de BENS, INSTALAÇÕES E SERVIÇOS PÚBLICOS, bem como, contra os servidores públicos e os usuários desses serviços. A IMPORTÂNCIA DA GUARDA MUNICIPAL NO PLANO DE SEGURANÇA PÚBLICA MUNICIPAL Nesta mesma ordem de idéias, para que o Município possa ingressar e assumir um papel ativo e dinâmico no campo da administração da justiça, segurança pública e direitos humanos, torna-se imprescindível que a Administração Municipal viabilize a implementação de todas as medidas necessárias à construção de uma nova identidade institucional às atuais guardas municipais, dentro de um contexto de política de segurança urbana no município. Construir a compreensão do papel da segurança urbana municipal -e da própria Guarda Municipal -não apenas por parte de seus profissionais, como também por parte da própria administração municipal e da comunidade, inaugura uma nova concepção de segurança pública, qual seja, de promover segurança preventiva e comunitária, tendo a atual Guarda Municipal como órgão executor dessa nova política. Para tanto, é necessário à administração municipal, conhecer e identificar de forma precisa a dinâmica da violência no município. O diagnóstico é imprescindível (e esse é seu objetivo) para a elaboração de um planejamento estratégico a partir de dados concretos, que viabilize a implementação de ações eficazes de segurança pública municipal e de prevenção da violência, em última análise, viabilizando um verdadeiro Plano Municipal de Segurança e Prevenção da Violência. A PEC 534/2002 x MUNICIPALIZAÇÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA Mais uma vez andaram mau nossos legisladores, ao optarem, dentre as várias propostas de emenda constitucional para alterar a estrutura das nossas Guardas Municipais, por uma proposta que praticamente "sobe pra cima" e "desce pra baixo" ao estabelecer uma alteração medrosa, inverossímil e divorciada do tempo e da realidade de questionamento das instituições públicas e esgotamento das estratégias tradicionais de controle social formal. O texto proposto pela PEC 534 de 2002, ficou assim: "Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de suas populações, de seus bens, serviços, instalações e logradouros públicos municipais, conforme dispuser lei federal" Vejamos então. A proteção de uma população pode ser feita de inúmeras formas, mas quando se trata de segurança pública, deve-se ter em mira o exercício legítimo do poder de polícia. A locução "logradouros" também choveu no molhado, porque "logradouros públicos municipais" estão inseridos no universo dos bens públicos municipais. Outro detalhe. Esta PEC foi elaborada em 2002, ou seja, exatos 07 anos atrás, quando, obviamente, o contexto sócio-econômico e a segurança pública não estavam nos patamares hoje, assumidamente, caótico. Perdeu-se, então, a grande oportunidade de se criar uma força policial nova, saudável, sem os erros e vícios já notórios das atuais policiais. A par da incongruência histórica havida na dualidade polícia militar x polícia civil, perdeu-se a oportunidade de se criar uma instituição policial única, para fazer um único trabalho com vistas a um único objetivo: manutenção da ordem pública e pacificação social. O que se percebe quando se analisam as resistências ao reconhecimento das Guardas Municipais como instituição policial municipal, vamos encontrar discursos exatamente iguais aos que mantém a dualidade polícia militar x polícia civil, as mais das vezes, e em sua maioria, capitaneados pelos mesmos integrantes das Polícias Militares. Aqueles mesmos homens, (optamos por usar a locução "homens" por refletir melhor o caráter da falibilidade e da mesquinhez do ser humano), que não querem abrir mão das "prerrogativas" (leia-se: privilégios) que seus cargos lhes proporcionam, e do poder factual e administrativo que detém, em detrimento do bem estar da coletividade e em socorro a um estado quase caótico (no caso do Rio de Janeiro, assumidamente, "guerrilha") de (in) segurança pública. Temos a favor da tese da , exemplos gritantes de sucesso do modelo das polícias municipais, melhor representado nos E.U.A, onde as existem cerca de 1.600 agências policiais federais e autônomas, 12.300 departamentos de polícia municipal e de condado e 3.100 xerifados. É um paradoxo, um contra-senso quase tragicômico: municipaliza-se o transporte, a saúde, a educação, mas a segurança pública ainda é federalizada e estadualizada. Ora, ninguém pode negar que a máquina do Estado desde há muito faliu, e as palavras de ordem agora são ficar apenas no essencial, enxugar, otimizar, desobstruir. É um absurdo que se negue a natureza de instituição policial às guardas municipais, única e simplesmente pela pouca ou nenhuma capacitação de seus componentes, com coisa que as polícias militar e civil sejam a mais alta expressão da competência. Com certeza que não. E os fatos estão ai, diariamente estampados na mídia falada e escrita para demonstrarem essa constatação. Os componentes essenciais do Estado se encontram genuinamente no município: quem tem território é o município, quem tem população é o município. O que é o Estado senão a divisão territorial formada pelo conjunto dos municípios. E o que é a União senão o somatório formado pelo conjunto dos Estados, constituídos pelo conjunto dos Municípios. Essa e outras discrepâncias têm levado Governadores como o do Rio de Janeiro a falar em revisão do pacto federativo. Mas este é um outro assunto, apesar de servir como amostragem do desequilíbrio federativo da nossa República Brasileira, onde os municípios têm que andar de pires na mão atrás da União, como se ela ainda fosse o doador de terras, o senhor feudal, o colonizador, o dono perpétuo. Quem sofre diretamente as cobranças do povo, são prefeitos, vereadores e secretários municipais, simplesmente porque eles estão diretamente ligados à população das cidades. Vamos citar aqui, apenas "ad referendum" que até hoje o DENATRAN não admite que Guardas Municipais, investidos mediante concurso público, sejam agente da autoridade de trânsito e desempenhem as tarefas de fiscalização de trânsito, mesmo estando explícita e gramaticalmente gizado no artigo 280 § 4º do CTB que o "agente da autoridade de trânsito competente para lavrar o auto de infração poderá ser servidor civil, estatutário ou celetista ou, ainda, policial militar designado pela autoridade de trânsito com jurisdição sobre a via no âmbito de sua competência". Portanto, pela dicção do dispositivo a condição "sine qua non" para o desempenho da fiscalização é que o agente seja DESIGNADO por ato da autoridade de trânsito, e que este ato recaia sobre SERVIDOR PÚBLICO CIVIL, ESTATUTÁRIO OU CELETISTA, ou ainda POLICIAL MILITAR. Ora, não está escrito em lugar algum do Código de Trânsito que o município tem que criar uma carreira própria de agentes de trânsito, que o órgão de trânsito NÃO PODE SER A GUARDA MUNICIPAL, e que tais agentes devem ter formação específica para o trânsito. Isso é a mais absoluta insandice, viagem, desprezo, desrespeito, pouco caso que existe hoje, em pleno ano de 2009, século XXI, no DENATRAN. Enquanto isso, os Tribunais de Justiça julgam a inconstitucionalidades de leis estaduais que se aventuraram a proibir o Município de utilizar suas guardas municipais nas atividades do trânsito municipal, conforme se poderá conferir no link. São situações como esta que nos fazem refletir e buscar meios alternativos de mobilização para que as Guardas Municipais possam assumir efetivamente seu papel de instituição genuinamente policial para atividades de prevenção e policiamento comunitário, integrando de vez o rol das demais instituições policiais constitucionalizadas. Roldenyr Alves Cravo Delegado de Polícia

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